Fórmula 1: luta Hamilton x Verstappen é o melhor que podia ter acontecido

A Fórmula 1 já não é o que era, mas a rivalidade entre Hamilton e Verstappen faz regressar alguma emoção e vontade de acompanhar as corridas. Será?

O GP de Itália, realizado no passado fim de semana, foi mais um episódio de uma rivalidade que está a crescer de intensidade e que recorda os tempos de outras rivalidades. Não são iguais porque os protagonistas são absolutamente diferentes, mas efetivamente trazem a emoção que faltava na disciplina máxima do desporto automóvel.

Ayrton Senna vs Alain Prost. Michael Schumacher vs Mika Hakkinen. Todos conhecem estes nomes e sabem quem são Max Verstappen e Lewis Hamilton.

Os protagonistas

O holandês é um produto precoce do automobilismo com uma ascensão meteórica que foi travada pela menor competitividade da Red Bull e das motorizações utilizadas. O britânico é um produto de Ron Dennis, que acolheu Hamilton no seio da McLaren e deu-lhe todas as condições para evoluir e “explodir” com o apoio da Mercedes. Foi ela que o fez multimilionário e recordista de quase todas as estatísticas da Fórmula 1.

Max Verstappen é o “patrão” da Red Bull e tudo é sacrificado no altar da vedeta holandesa, seja decisões estratégicas, seja nos colegas de equipa. Todos foram sendo destruídos – Daniil Kvyat (2014), Jean Eric Vergne (2014), Carlos Sainz (2015), Daniel Ricciardo (2016), Pierre Gasly (2019) e Alexander Albon (2019) – para que Verstappen pudesse brilhar.

Já Lewis Hamilton conheceu um percurso com menos colegas de equipas, mas mais duro: teve de dobrar Fernando Alonso (2007), Heikki Kovalainen (2008), Jenson Button (2010) e a sua nemésis, Nico Rosberg (2013). Foi o único que bateu o britânico após um ano muito duro. Depois, chegou Valtteri Bottas que foi um serviçal sem mácula, que sai pela porta pequena rumo à Alfa Romeo deixando o seu lugar para Goerge Russell. Talvez o maior desafio para Hamilton, mas uma troca promovida por Toto Wolff, com o olhar já no futuro.

Reviravolta

Com o aumento da competitividade da Red Bull Honda – ironia das ironias, a Honda faz um grande motor no ano em que se vai embora! – visível nos testes de pré-temporada, a Mercedes pressentiu o perigo.

No entanto, não acreditou que a diferença fosse tão grande e acabou surpreendida. Lewis Hamilton voltou a exibir os tiques nervosos do passado e Max Verstappen mostrou a sua face de fanfarrão. Estilos diferentes, reações diferentes. Melhor? Pior? Nem uma coisa nem outra!

Nem Lewis Hamilton já com 36 anos e a caminhar para a saída da competição, nem Max Verstappen com sete temporadas no bolso, mas apenas 23 anos, têm o carisma dos pilotos que referi no início. E desconfio que nunca vão ter!

O piloto da Mercedes está mais virado para a moda e para a defesa do ambiente, o holandês parece que está a demorar a amadurecer. Nenhum consegue ter o carisma de Ayrton Senna ou Alain Prost ou ainda Michael Schumacher. Isto já para não falar em Niki Lauda, James Hunt ou outros...

Fórmula1. Emoção de volta às pistas

Ora, a rivalidade entre Lewis Hamilton e Max Verstappen foi a melhor coisa que aconteceu à Fórmula 1, lamentando-se, apenas, que Michael Masi seja muito diferente de Charlie Whiting e os comissários desportivos, com pilotos pelo meio, estejam a querer ser protagonistas.

Mantenho a opinião sobre o acidente do GP da Grã-Bretanha – foi um incidente de corrida e os pilotos têm de ser conscientes do que fazem em pista – que é exatamente a mesma que tenho sobre o que sucedeu em Monza.

É um incidente de corrida provocado pela ânsia de Lewis Hamilton ao ver os espelhos encherem-se com o Red Bull e pela sofreguidão de Max Verstappen ao ver ali à mão de semear o Mercedes de Hamilton. Deveria o holandês levantar o pé e passar pelo inglês mais à frente? Devia. Podia Hamilton ter-se resignado, como já o tinha feito depois da corrida de qualificação e deixar o holandês passar? Podia.

Porém, nenhum dos dois quis ceder e acabaram fora de prova – com vantagem para Verstappen que está na liderança do campeonato e já riscou mais uma prova até final da temporada – com o Red Bull a voar por cima do Mercedes e oferecer mais uma oportunidade de elogiar a ideia do “Halo”.

Infelizmente, na era das redes sociais e da comunicação absoluta, nem Lewis Hamilton nem Max Verstappen despertam a paixão de duelos do passado.

Tudo o que era escusado…

Já nos níveis de agressividade entre os “Hamilton fans” e os “Verstappen fans”, roçando o ódio e a má educação, nunca atingimos estes patamares. Basta seguir alguns fóruns ou as redes sociais durante as transmissões televisivas na Eleven. Comentadores e narrador foram arrasados sem dó nem piedade por uma das fações com resposta à letra do outro lado da barricada.

Mas isso é apenas ódio que encontra pasto seco para arder nas redes sociais e não uma rivalidade saudável. Por isso, estes desentendimentos entre Lewis Hamilton e Max Verstappen são das melhores coisas da Fórmula 1, mas os interpretes são fracos e tudo acaba espalhado pelo chão da indiferença a um piloto que quebrou o estigma do racismo na competição automóvel – mas que tudo faz para dar nas vistas – e um jovem precoce que endeusaram e está a ter dificuldades em colocar os pés no chão.

Faltam oito provas para o final do campeonato de 2021 e muita água vai correr debaixo da ponte. Vai haver mais episódios destes? Claro que sim! É isso que todos esperam e é isso que vai acontecer. A decisão do campeonato pode acontecer num desses incidentes.

E a Fórmula 1 espera que isso suceda para que todos esqueçam o dia em que a Fórmula 1 teve medo… de ter medo! Lewis Hamilton colocou o dedo na ferida ao falar da aleivosia da F1 ao se sujeitar aos interesses económicos e os muitos observadores espalharam sal nessa mesma ferida ao ridicularizarem aquilo que sucedeu no GP da Bélgica.

A decisão polémica!

Deveria a corrida ter acontecido? Não! Os atuais Fórmula 1 são verdadeiras pranchas de “skimm” que sofrem com o “aquaplaning” e fogem ao controlo dos pilotos mais depressa do que dizer “cuidado”!

Por isso, a corrida não deveria ter sido realizada porque em primeiro está a segurança dos pilotos. E não tem nada a ver, como muitos disseram, com cobardia dos pilotos. A culpa está nos regulamentos que privilegiam a aerodinâmica a tudo o mais. Bem dizia Enzo Ferrari que “a aerodinâmica é para pessoas que não sabem fazer motores.

Foi ele quem disse, também, que “não há triunfo ou glória no mundo que valha um centímetro de pele humana”.

Sim, o GP da Bélgica não deveria ter acontecido debaixo do dilúvio que se a bateu sobre as Ardenas, Michael Masi não deveria ter prestado um tão mau serviço à Fórmula 1 ao autorizar a farsa de um Grande Prémio de Fórmula 1 com classificação, pódio e distribuição de pontos, após três voltas atrás do “Safety Car”!

Como disse, a Fórmula 1 foi cobarde. Teve medo de ter medo e enfrentar os adeptos, os investidores, o poder do dinheiro. Teve medo de assumir que a atual Fórmula 1 não rima com chuva intensa e que hoje, num mundo profundamente voyeurista, tudo é escrutinado e como as opiniões são como os narizes, cada um tem o seu e usa como quiser, a Fórmula 1 teve medo de dizer basta!

Holofotes virados para o “Halo”

Por isso, o incidente entre Lewis Hamilton e Max Verstappen foi excelente para olvidar o GP da Bélgica e distribuir elogios a esmo sobre o “Halo” e sobre a proteção que ofereceu ao britânico que, não fosse o “Halo” não estaria cá para contar.

E Max Verstappen ofereceu mais pano para as carpideiras chorarem baba e ranho: o holandês olhou para Hamilton e como este estava a tentar tirar dali o carro, encolheu os ombros e afastou-se sem saber se estava tudo bem com o seu rival. Mais fel destilado sobre o holandês com resposta do lado dos adeptos laranjas a lembrar o sucedido em Silverstone.

Enfim, a Fórmula 1 está a viver um ano inesquecível com uma entusiasmante luta entre Lewis Hamilton e Max Verstappen. Mas, lamento, não tem a chama das rivalidades entre Ayrton Senna e Alain Prost, Michael Schumacher e Mika Hakkinen, Michael Schumacher e Damon Hill, James Hunt e Niki Lauda ou Alain Prost e Nigel Mansell. Outros tempos…